Cácia Goulart em "A Idade da Peste"- Foto: NELSON KAO

A Idade da peste | Peça-filme aborda o racismo e disseca o mal-estar da branquitude

Com exibições presenciais e on-line, solo audiovisual com atuação e direção de Cácia Goulart a partir de texto de Reni Adriano estreia na Oficina Cultural Oswald de Andrade e é seguido de debates com Allan da Rosa, Fabiana Moares, Rudinei Borges e Valmir Santos

O que aconteceria se uma mulher branca de classe média alta realmente se descobrisse branca? A que custo isso se daria, e qual o discurso possível dessa constatação? Foi a partir dessa provocação que o dramaturgo Reni Adriano e a atriz Cácia Goulart conceberam o solo em formato audiovisual A idade da peste, que estreia dia 17 de dezembro de 2021 (até 30 de dezembro) com exibições presenciais na Oficina Cultural Oswald de Andrade (Rua Três Rios, nº 363, Bom Retiro, São Paulo, SP) e on-line pelos canais das Oficinas Culturais do Estado de São Paulo e também no da atriz Cácia Goulart (veja datas e locais no final do texto).

Em cena, Senhora C. assiste ao assassinato do filho da empregada, encurralado pela polícia, dentro da sua casa de classe média alta. O episódio desencadeia um profundo exame de consciência em que os desejos inconfessados da branquitude emergem como um marcador racial aterrorizante, questionando a própria possibilidade de justiça em um mundo feito à imagem e semelhança dos brancos.

Mas engana-se quem espera da atuação de Cácia Goulart uma personagem branca se autoelogiando como “antirracista” ou performando mea culpa e comiseração. “Senhora C. não tem esse complexo de Princesa Isabel; não pretende ser reconhecida como a ‘branca redentora’ da causa. Pelo contrário: ela é consciente da infâmia do lugar racial que ocupa, sabe que esse lugar é indefensável”, reflete Cácia, que também assina a direção da peça. Para ela, o risco da abordagem pelo viés escolhido seria a tentação de redimir a personagem, ou cobri-la de elogios por sua consciência racial. “Mas a desgraça dela é saber que não basta ter consciência: ela está, como branca, submersa na indignidade, uma vez que reconhece seu lugar na branquitude, mas é incapaz de desocupar esse lugar privilegiado”, conclui.

Para o dramaturgo Reni Adriano, esse assunto costuma ser violentamente rechaçado por pessoas brancas, porque instintivamente reconhecem que subjaz a esse tema-tabu uma dose dolorosa de vergonha e infâmia. “Mas o status da branquitude se perpetua e se atualiza justamente nesse silenciamento”, pondera. Além disso, o autor, que é negro, ironiza que escrever para uma atriz branca funcionaria como uma espécie de mascaramento para que brancos possam ouvi-lo de boa vontade. “O fato de sermos um país em que negros não têm um dia sequer de descanso só é possível ao preço de que os brancos tenham uma dignidade muito frágil. Eu quero questionar essa dignidade frouxa dos brancos. Debater racismo com negros é fácil; o que eu quero é racializar os brancos em cena e situá-los no lugar de suas responsabilidades”, crava.

Escrita por um dramaturgo negro, portanto, para atuação de uma atriz branca, a peça mobiliza e tensiona os marcadores identitários raciais de modo a evidenciar que, antes de ser um “problema de negros”, o racismo é um flagelo de brancos. O exercício de franqueza de uma mulher branca sobre a perversão de seu próprio status identitário torna A idade da peste uma assombrosa reflexão em que pensar o racismo é um debate sobre o mal.

E para aprofundar o debate na urgência exigida pelo tema, a estreia conta com quatro convidados especiais. A exibição presencial do dia 17 de dezembro será seguida de uma conversa com o poeta e dramaturgo Rudinei Borges e o jornalista e crítico Valmir Santos, do Teatrojornal. Já a exibição on-line do dia 20 de dezembro contará com as apreciações do escritor e dramaturgo Allan da Rosa e da jornalista e colunista do The Intercept Brasil Fabiana Moraes.

O projeto foi contemplado pelo edital ProAC Expresso LAB 47/2020

SINOPSE

Uma mulher branca assiste ao assassinato do filho da empregada, acossado pela polícia, dentro da sua casa de classe média alta. O episódio desencadeia um profundo exame de consciência em que os desejos inconfessados da branquitude emergem como um marcador racial aterrorizante, questionando a própria possibilidade de justiça em um mundo feito à imagem e semelhança dos brancos. Escrito por um dramaturgo negro para atuação de uma atriz branca, a peça mobiliza e tensiona os marcadores identitários raciais de modo a evidenciar que, antes de ser um “problema de negros”, o racismo é um flagelo de brancos. O exercício de franqueza de uma mulher branca sobre a perversão de seu próprio status identitário torna A idade da peste uma assombrosa reflexão em que pensar o racismo é um debate sobre o mal.

SERVIÇO
Peça – filme
A idade da peste
Duração: 75 minutos | Classificação etária: 16 anos | Gratuito

Exibições presenciais:
Cineclube da Oficina Cultural Oswald de Andrade
Endereço: Rua Três Rios, 363 – Bom Retiro – São Paulo/SP

• Dia 17 de dezembro, às 19h – seguida de debate com os convidados Rudinei Borges e Valmir Santos

• Dia 18 de dezembro, às 18h.30 lugares (Retirada dos ingressos com 01 hora de antecedência)

(Entrada permitida somente com o uso de máscara cobrindo nariz e boca. Durante a permanência no local, siga os protocolos sanitários para prevenção da Covid-19)

Exibições On-line – PARTE I:
Onde: Youtube das Oficinas Culturais do Estado de São Paulo

• Dia 20 de dezembro, às 20h – seguida de debate com os convidados Allan da Rosa e Fabiana Moraes

• Dias 21 e 22 de dezembro, às 20h

Exibições On-line – PARTE II:
Onde: Youtube Cacia Goulart

De 23 a 30 de dezembro de 2021, às 16h e às 20h.

Sobre Emílio Faustino

Formado em jornalismo, atua na área há mais de 15 anos. Amante da sétima arte, no YouTube apresenta o canal EmpoderadXs onde entrevista atores, diretores e ativistas. Atuou em empresas como Rede Globo e UOL, sempre com enfoque em cultura e ativismo. É diretor executivo e fundador do site EmpoderadXs, onde promove a união de minorias sociais e realiza seu sonho de dar voz para quem precisa.