Dia do Orgasmo | Ginecologista esclarece 10 dúvidas sobre o Orgasmo Feminino

Se conhecer e abandonar as amarras sociais que subtraem a sua individualidade é uma forma de se empoderar! Por isso, mulher, conheça seu corpo, suas sensações e reações.

No último século, o prazer feminino foi ressignificado: a expansão e o reconhecimento do espaço da mulher na sociedade, rompendo os eixos do patriarcado, permitiu que a sexualidade feminina fosse permitida, debatida, estudada e vivenciada. Mas muitos tabus ainda precisam ser desfeitos e a melhor estratégia para isso é conhecer o próprio corpo e suas possibilidades.

Na idade média, acreditava-se que a mulher precisava atingir o orgasmo para engravidar – o que fazia com que os homens fossem atenciosos para que o clímax da parceira fosse alcançado. Isso não fala sobre protagonismo, mas sim sobre coação da mulher sobre o prazer alcançado: era uma obrigação. Uma gestação após estupro, por exemplo, seria usada como arma de acusação pelo prazer obtido naquela relação.

Já no Reino Unido, durante a era vitoriana, o médico Pierre Briquet dizia que um quarto das mulheres sofria de “histeria” e os sintomas incluíam desejo sexual e lubrificação vaginal excessiva. A sexualidade feminina normal foi transformada numa condição médica e o tratamento prescrito era massagem pélvica. Na verdade, esse tratamento deu origem ao uso dos primeiros vibradores. Ou seja, tratava-se a histeria com orgasmos.

O silêncio e, mais que isso, a condenação da sexualidade fez com que as mulheres evitassem as discussões acerca do sexo, do corpo e das suas relações. É importante perceber que essa privação representava um ato político de controle da mulher. Somente em 1952 a Associação Americana de Psiquiatria abandonou o diagnóstico de “histeria” e definiu que esses chamados “sintomas” eram normais e saudáveis. A segunda onda do feminismo na década de 60 e a revolução sexual ajudaram a reverter essa lógica e abrir um novo espectro em relação aos papéis de gênero, o corpo e a sexualidade.

As expectativas sociais em torno do orgasmo feminino podem ser particularmente angustiantes para as mulheres que não o conhecem. E quando cenas de sexo presentes em filmes se mesclam com a realidade, a diferença entre expectativa e a realidade pode ser muito frustrante. Curiosidade: Hedy Lamarr, nome artístico de Hedwig Eva Maria Kiesler, foi a primeira mulher a protagonizar em uma cena de orgasmo nas telas do cinema no início de 1933.

Léa Séguin – pesquisadora do Departamento de Sexologia da Universidade de Québec – examinou como o orgasmo feminino é representado na pornografia. Entre os 50 vídeos mais populares analisados, apenas em 18,3% as mulheres atingiram o orgasmo e a estimulação do clitóris ou vulva apareceu somente em 25% deles. Além da omissão do orgasmo feminino na indústria pornográfica, a forma como ele é retratado promove e perpetua muitas expectativas irreais.

Vamos então esclarecer algumas coisas:

1) Eu nunca consegui chegar a um orgasmo. Isso é normal? 10% das mulheres nunca tiveram orgasmo. A ausência de orgasmo pode ter diversas causas: psicológicas ou físicas, uso de medicações, problemas com o parceiro/parceira e principalmente falta de informação e conhecimento sobre o próprio corpo.

2) Quantos tipos de orgasmo feminino existem e quais são eles? Os orgasmos podem ser classificados de várias maneiras. Uma delas é pela localização do corpo onde é gerado, podendo ser clitoriano, vaginal, anal, mamilar ou até por outras regiões mais incomuns. Podem ser também espontâneos, quando acontecem sem estímulo físico.

3) É possível ter orgasmos em outras atividades não sexuais? Segundo uma pesquisa realizada pelo Centro de Saúde Sexual da Universidade de Indiana, nos EUA, 40% das mulheres entrevistadas já tiveram prazer sexual e até orgasmo induzido pelo exercício. 45% disseram que a primeira experiência foi ligada a exercícios abdominais; 19%, ligado à bicicleta e corrida; outras experiências incluem vários exercícios, como ioga, natação, aparelhos elípticos e aeróbica. Existem relatos de orgasmos em situações atípicas, como no trabalho de parto, por exemplo.

4) Existem orgasmos múltiplos?
A psicóloga australiana Kachina Allen descobriu indícios preliminares de que regiões específicas do cérebro masculino deixam de responder a estímulos sensoriais dos órgãos genitais logo depois do orgasmo. Enquanto isso, o cérebro da mulher continua a ser ativado. O pênis tem apenas um caminho para levar as sensações até o cérebro, enquanto o aparelho genital feminino tem três ou quatro vias, o que permite a ocorrência de orgasmos múltiplos.

5) A mulher ejacula como o homem?

O orgasmo ejaculatório ocorre quando uma secreção é liberada pelas glândulas de Skene (glândulas presentes na genitália da mulher, próximas à uretra e que equivalem à próstata no homem). Não existe correspondência entre a quantidade de secreção e a intensidade de prazer; na verdade, é uma tendência pessoal de acordo com o desenvolvimento dessa glândula. Outras glândulas presentes na genitália feminina são as de Bartholin, que tem a função apenas de lubrificação durante o estímulo sexual.

6) O que exatamente é o Ponto G? 

O ponto G é assim chamado em homenagem a um médico chamado Ernest Gräfenberg, que em 1950 descreveu a presença de uma zona erógena na parede anterior da vagina ao longo do trajeto da uretra. Não é um órgão específico e nem pode ser identificado ao toque. Em palavras simples, seria uma área na entrada da vagina, próximo à uretra, ricamente enervada, que ao ser estimulada poderia proporcionar orgasmos mais facilmente, assim como o clitóris.

7) Além do G, existem outros pontos de prazer parecidos com ele?

Cada mulher deve aprender a se tocar e descobrir quais são suas próprias zonas eróticas. As possibilidades são múltiplas e individuais.

8) Existe tratamento médico para facilitar o orgasmo?

Conhecida nos EUA como G-Shot, a técnica promete aumentar o ponto G por meio de injeções intravaginais de colágeno, aumentando o atrito durante a penetração e permitindo assim que a mulher chegue ao orgasmo mais facilmente. A técnica gera polêmica e não é reconhecida pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.

9) Exercícios pélvicos podem aumentar a chance de atingir o clímax?

Nos anos 40, o ginecologista alemão Arnold Kegel, em busca de um tratamento para evitar e tratar as incontinências urinárias criou uma série de exercícios com a finalidade de fortalecer os músculos do períneo. Os chamados exercícios de Kegel – e suas derivações utilizadas no pompoarismo – na verdade proporcionam um melhor conhecimento pessoal sobre os músculos do períneo e as sensações que eles podem proporcionar. Com isso, muitas mulheres relatam mais facilidade em atingir orgasmo e maior prazer nas relações sexuais.

10) Ausência de orgasmo significa um desempenho sexual insatisfatório?

Na idade média sim, quando acreditavam ser a única forma de engravidar. Na indústria pornográfica sim, mas só para o homem, pois dificilmente o orgasmo feminino é explorado. Na vida real, o orgasmo pode ou não ser consequência de múltiplos estímulos e sensações possíveis numa relação sexual. Se colocado com meta, todas as sensações desfrutadas no percusso podem passar a segundo plano, quando na verdade a sexualidade saudável deve valorizar todas as formas de interação com o corpo e todo o prazer que isso pode proporcionar.

Curiosidade: O tantra é uma filosofia tribal que ensina a ter na experiência sexual um caminho para o despertar da Kundalini: a energia sagrada da vida. Nessa filosofia, o importante é a construção do orgasmo para que, se atingido, seja consequência do prazer e da energia gerada com a entrega.

Se conhecer e abandonar as amarras sociais que subtraem a nossa individualidade é uma forma de se empoderar! Por isso, mulher, conheça seu corpo, suas sensações e reações. Elas são armas importantes para a sua independência e realização. Sexualidade é liberdade.

Sobre Tiago Oliveira

Retirante nordestino, com formação médica em ginecologia pela USP. Gay, encontrou sentido pra vida na luta por direitos humanos e na promoção de justiça social. Gosta de arte, de viagens, de ciência, mas principalmente de pessoas. Toca violão, canta no chuveiro, escreve poemas e tatua o corpo.