O Oficial e o Espião | Novo filme de Polanski investiga a traição de um capitão judeu

Sobrevivendo na polêmica de acusações de estupros de menores, diretor Roman Polanski foi premiado com o Cesar francês de Melhor Diretor por drama militar que chega aos cinemas brasileiros.

Para alguns, O oficial e o espião (2019) conversa diretamente com a vida pessoal do diretor pois explora um famoso caso de perseguição a um inocente que se provou injusta anos depois. O responsável por desfazer a injustiça é o objeto de Polanski: o oficial Georges Picquart (Jean Dujardin). Em sua passagem pela unidade militar de contra-espionagem, Picquart toma conhecimento de que informações confidenciais continuam sendo repassadas à militares alemães, apesar da escandalosa prisão do Capitão Alfred Dreyfus, acusado de traição por alta espionagem. O espião é um jovem soldado judeu que foi aluno de Picquart na academia e com quem não mantinha relacionamento pelo fato do professor se declarar assumidamente a ele como anti-semita.

Condenado à prisão perpétua na Ilha do Diabo, Dreyfus mantém-se discreto e resignado com seu infortúnio, porém não perde as esperanças. Já Polanski, investe-se de autor e encara a opinião pública em sua participação do festival de Veneza com seu filme. Causou uma forte reação contrária, inclusive, de Lucrecia Martel, presidente do juri, que declarou-se “desconfortável” com a presença do diretor no prestigiado festival italiano.

Em sua defesa, Polanski faz uma cena de abertura belíssima, com um travelling revelador da gravidade da ação de Dreyfus. Sua reputação será destruída humilhantemente pelo exército francês. E quando descobrimos que o povo também nos acompanha nesta terrível cerimônia, temos que tomar algum partido.

Vendedor de jornal segura panfleto acusatório escrito por Emile Zola citado em O oficial e o espião

Daquele 22 de dezembro de 1894, quando a sentença foi proferida, na verdade, a portas fechadas depois de um julgamento rápido, até o desfecho do filme, em 1906, acompanhamos um dos casos mais emblemáticos de fraude de documentos e informações ocultadas por autoridades militares que manchou para sempre a face da maior instituição francesa à época. Imersa no fracasso da Guerra Franco-Prussiana de 1971, as ambições nacionalistas francesas se recalcaram no anti-semitismo latente e dividiram o país entre os apoiadores do espião suspeito e os detratores do condenado. Daí a ferida aberta que faz judeus e não judeus revisitarem o caso.

Sem nenhuma novidade, a reconstituição de época embala a história com uniformes completos e verossímeis, cores significativas e um desenho de arte feito na medida para criar boas metáforas visuais. Há um sensorial intenso, bem colocado, com ótimo uso do cenário, que pontua corretamente os conflitos.

Emmanuelle Seigner em cena de O oficial e o espião

Para quem não separa o autor de sua arte, como também acontece com Woody Allen, O oficial e o Espião é um filme com qualidades técnica e artística bem acima da média. O roteiro é o ponto mais frágil da obra, com perguntas previsíveis e um ou outro personagem dispensável, mas dá bom espaço às atuações de Louis Garrel como Dreyfus e Grégory Gadebois como Henry. Ao contrário, Emmanuelle Seigner, como Pauline Monier, não consegue boa expressividade e se perde na trama militar.

E para as mulheres e quem mais empatizar com o sofrimento incabível das vítimas conhecidas de Polanski as cortinas não se abrirão. Neste caso, ainda esperamos por uma reparação histórica.

O Oficial e o Espião tem previsão de estreia em 12 de março nos cinemas de todo o país.

Confira o trailer abaixo:

Sobre Magah Machado

Paulistana, designer e analista de informação, entusiasta de expressões artísticas livres e autênticas na dança, cinema, música e fotografia como motores propulsores de mudanças no mindset careta e convencional