Todo dia | Filme é um verdadeiro convite para desenvolver um olhar mais empático ao próximo

   Alteridade, empatia, solidariedade. Pode-se achar tudo isso em “Todo dia”, mas isso seria o óbvio. O filme vai muito além: é sobre a essência de quem realmente somos.

   O jovem diretor Michael Sucsy (Para sempre, 2012) transpõe para as telas o bestseller de David Levithan e consegue oferecer uma gama de sentimentos a partir de uma história de amor impossível, mas que todo mundo deveria conhecer. Quem acreditaria que uma alma perdida por este mundo afora possa encarnar em um corpo diferente todo dia e ainda por cima, se apaixonar por uma pessoa real?

   Chamada apenas de “A”, esta alma irá mostrar a Rhiannon (Angourie Rice, Dois Caras Legais, 2016), uma adolescente com problemas típicos de sua idade, que, para se colocar na posição do outro e tentar entendê-lo, não é preciso interferir em suas decisões e ações. Assim, Rhiannon acompanha diariamente todas as diferentes encarnações de “A”, que representam variações étnicas, morais, corpóreas e comportamentais cheias de graça e questionamentos pertinentes ao desenrolar da trama. A escolha dos atores para “A” é bastante diversa, portanto, alguns são mais bem-sucedidos em transmitir o cerne de seus personagens em tão poucas cenas.

   Assim, a garota parte de um dia inesquecível com “A” habitando o corpo de Justin (Justice Smith, Jurassic World, 2018), seu namorado, elabora suas dúvidas enquanto se relaciona com uma garota nova em sua escola, um menino devoto que conhece em uma festa, um gordinho asiático, uma garota negra, um menino negro, um menino atlético, uma teen transgênero, uma garota suicida e, claro, defronta-se com si mesma quando “A” encarna na incrédula menina. Este é o momento em que testa hipóteses, muda seu relacionamento com seu pai Nick (Michael Cram) e sua mãe Lindsey (Maria Bello, em boa atuação) e se arisca a envolver-se mais com a essência de “A”. Rhiannon vê claramente seu âmago e apaixona-se. “Então, você é uma garota ou um garoto?”, pergunta a “A”. “Isso” é a resposta, pontuando um dos belos momentos do filme.

   Insolúvel a olhos vistos, a situação de “A” revela à adolescente que a crescente paixão que os une não terá nenhum futuro, mas isso não é novidade para “A”, total descrente em viver o amanhã por absoluta falta de experiência. Porém, a dor e o sofrimento inerentes convencem Rhiannon que sim, é preciso interferir de algum forma na vida que “A” assume por aquelas 24 horas. Juntos, buscam deixar marcas, um legado, ajudar um ao outro a fazer a diferença. E resolver seu caso de amor surreal.

   A saída encontrada por “A”, porém, acaba caindo em um final convencional  pois ela escolhe Alexander (Owen Teague). Considerando-se um filme com um argumento tão único, talvez outra escolha pudesse ter melhor efeito. O final previsível tende a neutralizar questões importantes surgidas no enredo, como poligamia, bisexualidade, suicídio, auto-referência e resiliência, que poderiam ter sido exploradas um pouco mais.

   Mesmo assim, o filme consegue mergulhar para além das aparências. Com toda a carga de metáforas que se seguem, está algo que é mais difícil de se identificar que alteridade ou empatia: a própria essência do outro. Simples como um “A”, tão raro como uma alma gêmea. “Todo dia” consegue materializar um ínfimo destas reflexões, o que vai render muito sobre o que se pensar na saída do cinema.

Todo Dia estreia no Brasil em 12 de julho, confira o trailer:

Sobre Magah Machado

Paulistana, designer e analista de informação, entusiasta de expressões artísticas livres e autênticas na dança, cinema, música e fotografia como motores propulsores de mudanças no mindset careta e convencional